Star Wars nunca realmente morreu. Após o fim de cada
trilogia, o público geral deixou a saga adormecer até que os novos capítulos
chegassem, mas aqueles que nutrem um amor pela saga sempre a buscaram em outros
veículos, como livros, quadrinhos, jogos e eventos/encontros de fãs (como as
Jedicon). Contudo, por mais que o Universo Expandido (apesar de possuidor de
muitos materiais regulares) nos tenha presenteado com histórias
interessantíssimas, nada se compara a novos filmes, e o anúncio de uma nova
trilogia e derivados após a compra da Lucasfilm pegou todos de surpresa,
gerando um hype quase contínuo pela saga. Havia desde cedo, porém, um problema:
George Lucas não sabe dirigir filmes e estragou a Segunda Trilogia. Devido a
esse fato e à enorme qualidade da Trilogia Clássica, cada vez mais
intensificou-se a nostalgia em relação aos filmes de 1977-1983.
Frente a esse problema, a Disney e a Lucasfilm (agora sob a
presidência de Kathleen Kennedy) possuíam basicamente duas escolhas: seguir
para terceiros e quartos caminhos ou retomar o caminho exato dos três primeiros
filmes. Entre a ousadia e a zona de conforto, escolheu-se a segunda opção. Aí
reside, portanto, o problema da Terceira Trilogia em si. Não se trata, neste
momento, de avaliar a qualidade isolada de cada filme (dirigidos pelos
competentíssimos J. J. Abrams e Rian Johnson), mas do conceito básico que rege
não apenas essa nova trilogia, mas também os derivados e até mesmo produtos
licenciados. Com exceção dos recém anunciados derivados de Rian Johnson (de que
nada sabemos), todos os derivados (mesmo os adiados) passam-se no período que
constitui a Trilogia Clássica: Rogue One,
Han Solo e o nebuloso filme do Boba Fett. Não se encontra mais com facilidade
produtos licenciados de cavaleiros Jedi ou Clone troopers, mas sim de
Stormtroopers, rebeldes e Darth Vader. A série The Clone Wars foi substituída por Rebels (cujo nome já diz tudo).
Quanto à nova trilogia, passa-se algumas décadas após O Retorno de Jedi, e se trata de um
caminho completamente natural, sendo até mesmo a intenção de Lucas, antes de
vender a sua empresa à Disney. O problema reside em destruir tudo o que foi
construído durante e após o Episódio VI
(destruição do Império, estabelecimento de uma nova República, o surgimento de
uma Nova Ordem Jedi) para que tudo voltasse à estaca zero e os filmes pudessem
mais uma vez tratar da dicotomia Império/Rebelião (agora chamados Primeira
Ordem e Resistência, respectivamente). Se a Aliança Rebelde conseguiu, a muito
custo, destruir o Império, com grande facilidade o mesmo ressurgiu. Se após o
fim do Império houve enorme esforço para se instaurar um novo sistema político,
esqueça, pois o mesmo foi destruído em um piscar de olhos através da Base
Starkiller. Se Obi-Wan e Yoda esforçaram-se para não deixar a Ordem morrer ao
treinarem Luke Skywalker, foi tudo em vão, pois a lenda viva falhou
miseravelmente. Agora a mesma esperança que a Aliança Rebelde constituía está
na Resistência; a mesma responsabilidade que Luke tivera em manter os Jedi
vivos está em Rey.
Por se tratar de um prelúdio, a Segunda Trilogia não anula
nada do que foi estabelecido anteriormente (a não ser por acrescentar os Midi-chlorians
e outros pequenos detalhes que irritaram muitos fãs mais velhos). Se falhou
miseravelmente, foi pela sua execução, e não pelo seu conceito em si. A série The Clone Wars é a prova viva de que, se
bem executadas, todas as ideias que envolvem essa trilogia prelúdio poderiam
haver transformado-se em algo incrível. A atual trilogia, porém, anula
literalmente tudo o que foi construído com os três filmes originais. Se O Despertar da Força reconstitui cada
detalhe narrativo do filme de 1977, Os
Últimos Jedi inova nos tais detalhes e na forma de contar a história, mas
permanece fazendo parte de um processo de repetição a que estava fadado desde a
compra da Lucasfilm. Talvez o desejo do diretor Rian Johnson de inovar na
narrativa seja justamente o seu modo de fugir do fardo já instaurado (sendo Ben
Solo a principal figura de inovação – uma ironia, sendo ele um Skywalker).
Assim sendo, se Os Últimos Jedi
engana o expectador nos primeiros dias, fazendo parecer um capítulo inovador na
saga, a longo prazo deve ficar claro que a mal executada Trilogia Prelúdio é de
fato muito mais corajosa, apesar de igualmente muito mais fracassada. Não
acredito, porém, que isso seja algo sintomático de que o público quer mais do
mesmo. Acredito realmente que exista uma grande demanda por material novo, mas
a incrível má execução dos Episódios I, II e III (o terceiro em muito menor
escala, até mesmo sendo considerado por tantos um dos melhores da saga) deixa
impossível qualquer maior apreciação sobre os planos de George Lucas.
Apesar de se tratar de uma visão do conjunto, é de se
acreditar que isso afete os Episódios VII, VIII e IX, mas o sétimo filme – por
ser o primeiro de uma trilogia – talvez seja o menos prejudicado nesse quesito.
Spoilers a seguir:
Ainda no que tange a culpas que vão além do filme, Os Últimos Jedi tem como forte problema
cumprir expectativas estabelecidas no filme anterior (talvez o maior culpado,
por livrar-se de resolver questões e deixá-las para o filme seguinte, de outro
diretor). Muito se falava da Capitã Phasma antes de O Despertar da Força, e a mesma não mostrou nem um pouco a que
veio. Porém, tudo podia ser resolvido pela frase “no próximo filme isso se
acertará”. De fato a personagem foi mostrada com mais dignidade na continuação,
mas não o suficiente para justificar tanta promessa. Contudo este é o menor dos
problemas, uma vez que a identidade de Rey (assim como a de Kylo Ren, porém
revelada já em 2015) foi desde sempre questão de enorme mistério e importância
não só pelos fãs, mas pelo próprio primeiro filme, e após dois anos de espera,
a revelação de que ela é filha de dois bêbados é um desserviço. Ou a revelação
de que ela é filha de “dois ninguéns” deveria ocorrer no primeiro filme, ou a
revelação do segundo filme deveria ser mais significativa. Três (pois a
ansiedade já existe desde um ano antes do primeiro) anos de um mistério que
revelou-se tão insignificante é um desserviço não só ao fã, mas a qualquer
narrativa que se estenda por mais de uma obra.
Algo muito semelhante ocorreu em relação ao Líder Supremo
Snoke, um mistério que data igualmente de três anos atrás, e permanece não
resolvido. Não seria um problema, uma vez que ainda nos resta o capítulo final,
mas o personagem está morto. Não é preciso entender de narrativa para saber que
o expectador é muito mais impactado pela morte de alguém quando sabe sobre o
personagem. O desconhecimento não impede a cena de arrepiar o público, mas
poderia ser ainda mais impactante. Há sempre o argumento “mas podem explicar no
próximo filme”, mas o personagem já não mais existe. Além disso, qualquer
argumento em defesa de um filme atual que envolva o próximo é descabido de
fundamento, constituído de puro escapismo.
O grande problema do filme que independe dos anteriores é o
arco do Finn e da Rose, de longe o mais desinteressante da saga em anos. A
personagem parece fruto de uma necessidade de consolo ao amado stormtrooper do
primeiro filme, “friendzoneado” pela última Jedi. Toda a busca por um
decodificador é não só desinteressante, como desimportante, uma vez que em nada
auxilia na sobrevivência dos rebeldes. O personagem de Benício del Toro, por
sua vez, remete a Lando Calrissian, devido à sua traição. O segundo, porém,
mostrou ainda naquele filme a que veio, enquanto o decodificador mostra-se
apenas uma aleatoriedade no roteiro. Pode-se arriscar dizer, ainda, que os
personagens Finn e Poe Dameron estão menos carismáticos do que em seus filmes
de origem (obviamente devido à circunstância da narrativa), mas não se trata de
algo muito relevante.
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